Os eleitores britânicos vão às urnas no dia 4 de julho para votar nas eleições gerais convocadas pelo primeiro-ministro Rishi Sunak.
Mas o sistema eleitoral adotado pelo país é peculiar e muito diferente do brasileiro, por exemplo.
Para começar, o país é uma monarquia parlamentarista, com voto distrital.
Chefes de Estado e de Governo
Isso significa que o rei Charles 3 é o chefe de Estado, mas sem nenhum poder político.
Embora todas as leis sejam promulgadas formalmente em seu nome, sua função é basicamente cerimonial, representando o país em visitas de dignitários estrangeiros ou em viagens ao exterior.
O poder político de fato é exercido pelo Parlamento e o chefe de governo é o primeiro-ministro.
Voto distrital
No entanto, devido ao sistema de voto distrital, os eleitores não votam para eleger o primeiro-ministro diretamente.
Eles votam para eleger os deputados (members of Parliament, ou MPs, em inglês) que vão representar o distrito onde moram na Câmara dos Comuns –uma espécie de Câmara dos Deputados, no Brasil.
O Reino Unido é dividido em 650 distritos, com territórios desenhados de acordo com a população –para que cada um dos deputados represente um número similar de eleitores no Parlamento.
O candidato que tiver mais votos em cada distrito é eleito para representar aquela área.
Depois disso, o partido político que tiver maioria de deputados eleitos ganha o direito de governar. No caso, o partido que conseguir eleger no dia 4 de julho mais de 326 deputados.
O líder do partido majoritário, então, recebe autorização formal do rei para formar um governo e assume o cargo de primeiro-ministro.
Caso nenhum partido consiga maioria na Câmara dos Comuns, a legenda que tiver mais deputados eleitos pode tentar criar uma coalizão com outros partidos menores ou formar um governo de minoria –que precisaria lutar voto a voto para a aprovação de qualquer lei.
Campanha eleitoral
O sistema distrital também influencia demais a forma como as campanhas são feitas no país.
Como cada partido tem um candidato em cada distrito, os políticos só precisam fazer a campanha dentro das áreas desses distritos.
Por isso, eles literalmente batem de porta em porta pedindo votos e distribuem santinhos nas ruas se apresentando aos eleitores.
Por aqui, não existe campanha eleitoral gratuita no rádio ou na TV, grandes comícios ou enormes orçamentos de fundos eleitorais.
Os líderes dos partidos são praticamente os únicos que viajam pelo país, usando sua popularidade como possíveis futuros primeiros-ministros para pedir votos aos seus aliados.
Voto pelo correio e identidade com foto
No Reino Unido é possível também votar pelo correio, caso a pessoa esteja de férias, fora de seu domicílio eleitoral ou simplesmente achar mais conveniente ficar em casa no dia da eleição.
O dia da votação não é feriado e elas costumam acontecer, por tradição, numa quinta-feira – como será o caso no dia 4 de julho. As cédulas são em papel e o eleitor vota no nome de seu candidato que, claro, muda em cada distrito. O nome do partido aparece abaixo do nome do candidato, mas não existe voto na legenda.
Este ano, pela primeira vez, os eleitores vão ter que apresentar um documento de identidade com foto para provar quem são e votar para o parlamento. Até as últimas eleições, eles apenas precisavam dizer quem eram.
Isso causou confusão nas últimas eleições locais, no início de maio, não apenas porque os eleitores não estavam acostumados, mas também pelo fato de que não existe no Reino Unido nenhuma carteira nacional de identidade.
Sem a existência de RG, os eleitores precisam levar para as urnas o passaporte, carteira de motorista, carteirinha profissional ou algum outro documento com foto.
Normalmente os resultados saem durante a madrugada do dia seguinte à votação — ou logo de manhã.
Uma curiosidade: por conta do clima no país, as eleições costumam ser convocadas pelo primeiro-ministro sempre na primavera ou no verão, quando está mais quente, há sol e as pessoas se sentem mais felizes.
A possibilidade de votarem contra o governo aumentaria em meio ao chuvoso inverno britânico. Sim, é sério.
Mandato de cada governo
O primeiro-ministro tem a prerrogativa de convocar as eleições quando melhor entender. Não há um termo específico de mandato para o governo.
Por isso, eleições podem, por exemplo, ser antecipadas.
Mas elas não podem ser adiadas indefinidamente. Uma lei recente estabeleceu que o primeiro-ministro é obrigado a convocar eleições no máximo em até cinco anos depois da primeira sessão do mandato em vigor do Parlamento.
O primeiro-ministro Rishi Sunak, por exemplo, poderia convocar as eleições até o fim do ano, mas resolveu convocá-las para julho, surpreendendo muitos políticos.
Antes dessa lei, valia apenas um acordo de cavalheiros segundo o qual um governante deveria convocar eleições aproximadamente a cada quatro anos.
Outra curiosidade: um político pode assumir como primeiro-ministro sem ter que disputar eleições gerais. Como o poder político é do partido com maioria no Parlamento, a legenda pode simplesmente escolher um novo primeiro-ministro entre seus deputados em caso de renúncia, morte ou golpe interno contra o chefe de governo.
Foi exatamente isso que aconteceu com os dois últimos primeiro-ministros do país: Liz Truss e o próprio Sunak não convocaram eleições depois de assumir o posto, usando o privilégio de terem uma bancada majoritária do Partido Conservador na Câmara dos Comuns.
Sunak ou Starmer
Por conta desse sistema e também do poder de cada partido, apenas duas pessoas podem realisticamente assumir o cargo de primeiro-ministro a partir do dia 5 de julho.
Sunak pode ser reconduzido ao cargo, caso os conservadores consigam vitórias surpreendentes em muitos distritos.
Ou, o que é mais provável, o líder do Partido Trabalhista, Sir Keir Starmer, poderá assumir se seu partido conseguir traduzir em votos em cada distrito a liderança que tem nas pesquisas nacionais: 44% de intenção de votos contra 23% dos conservadores.
No entanto, por causa desse sistema distrital, as pesquisas nacionais de intenção de voto não refletem necessariamente o número de deputados eleitos por cada partido.
Em 1997, por exemplo, quando Tony Blair assumiu o posto de primeiro-ministro, o seu Partido Trabalhista tinha cerca de 40% das intenções de voto. Mas elegeu mais de 60% do Parlamento –porque conseguiu vitórias inesperadas em muitos distritos onde os conservadores eram favoritos.
Por isso, as próximas semanas serão vitais e vão envolver disputas reais em muitos distritos.