Ação foi movida pelo MPT em 2019 após exclusão da função de motorista profissional na contratação de aprendizes
Ação foi movida pelo MPT em 2019 após exclusão da função de motorista profissional na contratação de aprendizes
O Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT) obteve novamente a condenação da Federação dos Trabalhadores em Transporte Rodoviário do Estado de Mato Grosso (FETTREMAT), do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas de Rondonópolis e Região (SETCARR), do Sindicato dos Condutores de Veículos e Trabalhadores Rodoviários do Vale do São Lourenço (SINTROVALE/MT), do Sindicato dos Motoristas Profissionais e Trabalhadores em Empresas de Transporte Terrestre de Cuiabá e Região (STETT/CR), do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Rodoviário e Motoristas Profissionais de Barra do Garças e Região (SINTTRO) e do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas do Transporte Terrestre de Rondonópolis e Região (STTRR). As entidades, que deverão pagar solidariamente R$ 150 mil por danos morais coletivos, cometeram ilegalidade na Convenção Coletiva de Trabalho 2018/2019 ao excluírem a função de motorista profissional da base de cálculo da cota para contratação de aprendizes. A Ação Civil Pública foi ajuizada pelo MPT-MT em 2019. No processo, o órgão destacou que qualquer restrição à implementação da cota de aprendizes por meio de negociação coletiva seria ilícita, pois suprimiria ou reduziria medidas de proteção legal de adolescentes e jovens, como, no caso, a cota de aprendizagem, medida de proteção legal para garantir a efetivação do direito à profissionalização. As entidades foram condenadas em março do mesmo ano, mas interpuseram Recurso Ordinário, e a sentença foi anulada pelo Acórdão da 2ª Turma de Julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (TRT23). Também foi determinado o retorno dos autos à origem (primeira instância), a suspensão do processo até a decisão do Tema 1.046 – objeto de Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) n. 1121633/GO, que versava sobre a validade de norma coletiva de trabalho que limitasse ou restringisse direito trabalhista não assegurado constitucionalmente –, e a revogação da tutela provisória de urgência outrora concedida ao MPT. Em 2 de junho deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao analisar o tema de repercussão geral, deu provimento ao Recurso Extraordinário, nos termos do voto do Relator, Ministro Gilmar Mendes, e, por unanimidade, fixou a tese de que “são constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis". Retorno à 1ª instância Cessada a suspensão processual, a juíza do Trabalho Substituta Simone Akemi Kussaba Trovão, da Vara do Trabalho de Alto Araguaia, decidiu pela manutenção da sentença de 1º grau. “A manutenção da decisão proferida, considerando a decisão de mérito do STF no Tema 1.046, ocorre pela seguinte razão: a nulidade da cláusula normativa em análise se dá em razão de terem sido ultrapassados os limites da negociação coletiva, em afronta ao Princípio da Adequação Negocial Setoriada. A cota de aprendizagem, como é conhecida a norma disposta no artigo 429 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), não pode ser objeto de negociação coletiva, pois se trata de dever jurídico apto a concretizar interesses difusos, ou seja, de titularidade de pessoas indeterminadas e ligadas por uma circunstância de fato, que, no caso, é a condição de aprendiz. A consequência lógica disso é que os sindicatos não detêm legitimidade para dispor de direitos de titularidade de toda a sociedade”, explica. Em sua defesa, os entes sindicais afirmaram que, devido à proibição da função de motorista profissional para pessoas com idade inferior a 21 anos, as empresas estariam tendo dificuldade em atingir a cota de aprendizes. Alegaram, ainda, que o setor administrativo não conseguiria absorver a demanda. Ao apreciar o tema, a magistrada destacou que, “justamente por causa da cota alternativa é que não faz sentido a limitação etária para a contratação apenas de jovens com idade superior a 21 e inferior a 23, porquanto nessa situação, os aprendizes não precisam trabalhar (executar as aulas práticas) em atividades proibidas para menores ou com limitações legais em geral”. E acrescentou: “Não se pode perder de vista o objetivo da cota de contratação de aprendizes, que é justamente a promoção de sua qualificação e inclusão socioeconômica, cumprindo assim a função social da empresa, o que não pode ser deixado de lado. Dessa forma, havendo previsão legal de cumprimento alternativo, a empresa deve cumpri-la sopesando para tanto não apenas o custo financeiro que tal medida acarretará ao seu empreendimento isoladamente, mas também no cumprimento de sua função na sociedade de gerar emprego, renda e fomentar a qualificação de jovens para inserção no mercado de trabalho, da qual poderá se beneficiar no futuro, ela própria ou seus clientes, escopo que seria esvaziado ao se flexibilizar a base de cálculo da cota em referência”. Com a decisão, as entidades deverão abster-se de celebrar instrumentos normativos que flexibilizem ou alterem a base de cálculo da cota legal de aprendizagem prevista na CLT e no Decreto n. 9.579/2018. Também estão proibidas de celebrar instrumentos normativos que impliquem supressão ou redução das medidas de proteção legal de crianças, adolescentes e jovens, nos termos do artigo 611-B da CLT. Caso haja descumprimento, a multa será de R$ 50 mil para cada ente sindical que firmar instrumento coletivo em desacordo com a sentença. Aprendizagem De acordo com o art. 429 da CLT, empresas de médio e grande porte são obrigadas a destinar no mínimo 5% e no máximo 15% das vagas cujas funções demandem formação profissional à contratação de aprendizes, a partir dos 14 anos. O contrato de aprendizagem assegura ao adolescente uma profissionalização compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico. Além de abrirem as vagas para aprendizes, os empregadores devem promover a capacitação desses jovens, por meio de cursos oferecidos pelo Sistema Nacional de Aprendizagem, escolas técnicas ou entidades sem fins lucrativos, voltadas à educação profissional. O MPT observa que tanto os aprendizes quanto a sociedade foram prejudicados pela norma coletiva. “O direito à profissionalização representa também a concretização de verdadeira política pública de formação e qualificação da força de trabalho nacional, sendo um dos pilares da atuação estatal na busca do pleno emprego, princípio da ordem econômica nacional (art. 170, VIII, da CF/88), pois sem adequada formação e qualificação profissionais não se está apto à devida inserção no mercado de trabalho”, concluiu o MPT. Destinação O valor será revertido em prol da região onde ocorreu a irregularidade, beneficiando diretamente a comunidade abrangida pela jurisdição territorial da Vara do Trabalho de Alto Araguaia-MT e demais municípios da base territorial das entidades sindicais. Os projetos serão apresentados pelo MPT e deverão contemplar instituições públicas ou privadas sem fins lucrativos, de reconhecida relevância social da região, especialmente as ligadas à área de profissionalização de jovens e adolescentes.