A Justiça Eleitoral cassou os mandatos do prefeito de Brasnorte, Edelo Marcelo Ferrari (União), da vice Roseli Borges de Araújo Gonçalves (União) e do vereador Gilmar da Obra (União), por abuso de poder econômico nas eleições municipais de 2024.
A decisão é assinada pelo juiz Romeu da Cunha Gomes, da 56ª Zona Eleitoral de Brasnorte, e foi publicada nesta quarta-feira (2).
O magistrado determinou que, após o trânsito em julgado da sentença ou eventual confirmação da cassação por órgão colegiado, a Presidência do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso (TRE-MT) seja comunicada para que tome as providências cabíveis com vistas à realização de novas eleições para os cargos de prefeito e vice-prefeito do município.
A cassação ocorreu no âmbito de uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), que apontou diversas irregularidades cometidas durante o pleito do ano passado, entre elas a compra de votos por meio do transporte de indígenas até os locais de votação, além da oferta de dinheiro, combustível e até frangos congelados ao povo indígena Enawenê-Nawê.
O juiz também condenou Rogério Gonçalves, João Gomes da Silva Júnior, Alexandre Augusto Gonçalves, Júnior Augusto Gonçalves e Gilmar Celso Gonçalves à sanção de inelegibilidade pelo período de oito anos, contados a partir das eleições de 2024, em razão da participação direta na prática dos atos abusivos.
Por outro lado, o magistrado decidiu não declarar a inelegibilidade do prefeito e da vice por entender que não ficou comprovada a participação dolosa ou a anuência deles nas irregularidades, conforme a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
"Conjunto robusto de provas"
Na sentença, o magistrado afirmou que o processo reuniu um "robusto conjunto probatório" que comprova a atuação deliberada dos investigados para interferir na liberdade do voto.
Entre eles, estão os depoimentos de indígenas e servidores públicos, vídeos e fotografias enviados ao Ministério Público, além de comprovantes bancários.
Um dos depoimentos mais relevantes, conforme o magistrado, foi o de uma servidora da Funai (Fundação Nacional do Índio), que atuava como presidente de prédio da Justiça Eleitoral na região.
Ela confirmou ter presenciado a chegada irregular de dois ônibus à aldeia indígena na véspera da votação, o que gerou tumulto entre os eleitores. A tentativa de transporte dos indígenas só foi contida após a intervenção do Exército.
Outro testemunho citado pelo juiz foi o do empresário contratado para realizar o transporte dos eleitores. Ele declarou que foi procurado diretamente por Rogério Gonçalves, servidor comissionado da Prefeitura de Brasnorte, que intermediou a contratação dos ônibus. O pagamento, segundo o empresário, foi feito por outro servidor municipal, João Gomes da Silva Júnior.
Rogério Gonçalves, que era subordinado ao prefeito, foi apontado como o principal articulador das ações, sendo responsável por contratar o transporte, realizar pagamentos e manter contato direto com a comunidade indígena.
O vereador Gilmar da Obra, segundo a sentença, também teve participação ativa nas práticas ilícitas. De acordo com a decisão, ele esteve presente em reuniões com os indígenas na véspera da eleição e foi designado como fiscal de urna nas seções eleitorais onde a maioria desses eleitores votou. Essa estratégia, segundo o juiz, reforça o vínculo direto entre o parlamentar e as ações voltadas à captação indevida de votos.
Embora não tenha sido comprovada a participação direta do prefeito e da vice nas irregularidades, o juiz concluiu que a chapa foi diretamente beneficiada pelo esquema.
Isso porque, segundo consta nos autos, 96 eleitores indígenas compareceram às urnas e votaram, número suficiente para interferir no resultado final do pleito, que foi decidido por uma diferença de apenas 155 votos.
“A atuação de Rogério, subordinado direto de Edelo, como coordenador do esquema, e a alocação dele como fiscal nas seções indígenas, demonstram a relação estreita entre a campanha e as práticas ilegais”, destacou o magistrado na decisão.
O juiz também reforçou que, para caracterização do abuso de poder econômico no contexto eleitoral, não é necessário comprovar que o candidato teve conhecimento ou participou diretamente dos atos ilícitos. Basta que ele tenha sido beneficiado pelas práticas, conforme já estabelece a jurisprudência do TSE.